“Eu
sou do Sul, é só olhar pra ver que...” - eu sou preta, branca, gorda,
homossexual, heterossexual, idosa, jovem, “eu sou do Sul”. Um Centro de
Tradições Gaúchas (CTG), acima de tudo, é um lugar social, ou seja, um espaço
de utilidade pública para a população utilizar. Sem restrições, todas as
famílias deveriam ser bem-vindas para dançar, conversar, produzir eventos. O
pedido de casamento a ser realizado em um CTG pela juíza foi uma decisão
sensata. O incêndio esse espaço foi uma violação.
Mesmo os CTG filiados ao Movimento
Tradicionalista, utilizam suas sedes para outros eventos. Os sócios (e
não sócios, já que esse espaço físico pode ser alugado) realizam atividades
diversas: festas de formatura, aniversários e, sim, casamentos. Acredito que o
senhor Paulo Brandt esteja desatualizado, ou como comentado pela Luciana
Carvalho, com círculo de amizades reduzido no meio tradicionalista. Seria
interessante atualizar suas redes sociais e verificar que um CTG tem vida
própria durante o ano, não funciona apenas na Semana Farroupilha. Dancei anos,
fui prenda, e nunca tive problemas ao conviver com homossexuais nesse ambiente.
São pessoas como qualquer outra. Aliás, em qualquer ambiente. Sinto muito,
senhor Brandt, mas, sim, um casal caracterizado de gaúcho é bem recebido em
outro “grupo” cultural, a mulata do carnaval pode dançar um vaneirão, e um
casal “hétero” pode aproveitar a noitada numa boate GLS.
Parece-me que muitas pessoas têm
aproveitado tais casos, da torcedora gremista, do incêndio no CTG, como tantos
outros, para incitar a violência - mesmo podendo promover a paz. Essas
manifestações, verbais ou físicas, têm violado a cidadania. Todas as culturas,
todos os credos, toas as opções sexuais precisam ser respeitadas para que se
constituem verdadeiramente como tradições e sejam perpetuadas. Conforme
definição do dicionário Aurélio, tradição é conhecimento ou prática resultante
de tradição oral. Hoje, mais do que oral, os meios de comunicação, em seus
diversos suportes, dão-nos esse espaço de transmissão de expressão, tradição e
busca pela igualdade de respeito.
Cada
grupo cultural perpassa suas características. O Centro de Tradições Gaúchas
cultua a história de nossos antepassados para que não percamos nossa origem.
Isso vale para todos conhecerem e perpetuarem ou não. Essa escolha é
individual. Já a sede social de um CTG é um espaço público para ser usufruído e
aproveitar esses momentos para ressaltar a ideia de Igualdade, Fraternidade e
Humanidade 365 dias no ano. Isso sim é Tradição. E mais, para que se mantenham
os curiosos dessa tradição, é preciso aprender a dialogar com as outras
culturas – até mesmo nas redes sociais – para que as futuras gerações continuem
a alimentar esse desejo de respeito. Eu sou do Sul. E você?
Luana
Iensen Gonçalves
Professora
de Língua Portuguesa